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Preconceito e falta de recursos para ampliação de vagas são os principais problemas enfrentados por portadores de deficiência

Karolliny Dias - 13 de Setembro de 2018 | 10h 52
Preconceito e falta de recursos para ampliação de vagas são os principais problemas enfrentados por portadores de deficiência
Foto: Divulgação

Em agosto, mês em que se comemora a Semana Nacional da Pessoa com Deficiência Intelectual e Múltipla, diversas entidades promoveram ações de inclusão social e de combate ao preconceito contra as pessoas portadoras de necessidades especiais. Apesar de ser celebrada há décadas, a data só foi formalizada no dia 27 de dezembro de 2017, pelo Governo Federal. O Projeto de Lei foi proposto pelo deputado federal Eduardo Barbosa (PSDB-MG).

A principal função do evento é sensibilizar governos e comunidades em relação às potencialidades das pessoas com deficiência, chamando a atenção para as suas necessidades. Com esse trabalho de conscientização, espera-se tanto a definição de políticas públicas quanto ações amplas de combate à discriminação.

Vale lembrar que deficiência é todo e qualquer comprometimento que abala a integridade física da pessoa, trazendo prejuízos para a sua locomoção, coordenação motora, fala, visão, audição e compreensão de informações, e que afeta também o seu relacionamento com os outros indivíduos. Daí a necessidade de se construir toda uma rede de assistência que ampare, apoie, trate, reabilite e, na medida do possível, qualifique profissionalmente esse cidadão, dando-lhe condições dignas de vida e de sobrevivência.

EQUOTERAPIA – Em Feira de Santana, a pessoa com deficiência dispõe de diversas instituições especializadas em cuidar de seu bem-estar. O Centro de Equoterapia Dragões do Sertão, do Esquadrão de Polícia Montada de Feira de Santana, é uma delas. A entidade é dirigida pelo psicólogo e Sargento da Polícia Militar (PM) Sidney de Jesus Souza e atende aos Portadores de Necessidades Especiais (PNE) mediante avaliação criteriosa, realizada por uma equipe multidisciplinar, composta por psicólogo, fisioterapeuta e pedagogo. “Após essa avaliação, o paciente é reencaminhado ao médico, portando um questionário estruturado com alguns dados que precisamos saber. O médico, por sua vez, indica ou contraindica a Equoterapia, apresentando sua justificativa”, explica.

Método terapêutico multidisciplinar, a Equoterapia engloba as áreas de saúde, educação e equitação e é uma das ferramentas mais eficientes no processo de reabilitação de pacientes com determinados tipos de deficiência. Isto porque, quando executa o passo, o cavalo possui movimento análogo ao do ser humano. A isso se dá o nome de movimento tridimensional. E, segundo o Sargento Sidney, é o que faz a diferença no tratamento.

Ele ressalta que, a cada 30 minutos de sessão, o praticante recebe cerca de 21.600 estímulos neuromotores, que se convertem na melhora do tônus muscular, do controle do tronco e da cervical, ajudando também na reeducação postural. “No âmbito psicológico, trabalhamos o estabelecimento do vínculo afetivo, a relação de cuidado, a afirmação de regras, a socialização, o empoderamento e a autoestima, além das atividades pedagógicas acontecerem de forma mais lúdica e prazerosa”, destaca.

O Sargento esclarece ainda que, para cada praticante de Equoterapia, é elaborado um planejamento individual de intervenção. “Ao final de cada sessão, os mediadores evoluem, por meio de relatórios diários, sobre os praticantes e pontuam se realmente está havendo progresso. Caso não esteja, mudamos a metodologia”, informa.

Há anos acompanhando a evolução clínica e a melhora de muitos pacientes, o Sargento PM Sidney Souza lamenta que o acesso a atendimentos de saúde e o processo de inclusão de pessoas com deficiências ainda caminhem a passos lentos. Ele reclama que faltam recursos para ampliar o número de vagas e para construir uma estrutura mais adequada ao tratamento dos alunos. “A nossa ajuda vem do Comandante da unidade, o Major Moncorvo, que prioriza o serviço de Equoterapia. Muitas vezes, ele promove a aquisição de materiais com seu próprio dinheiro”, enfatiza, salientando ainda que o Centro de Equoterapia Dragões do Sertão atende, hoje, a 35 crianças especiais.

PRECONCEITO – Hamilton Teles, presidente da Associação Feirense de Síndrome de Down Cromossomos 21, destaca que a entidade não atende somente às pessoas que possuem algum tipo deficiência, mas também aos familiares delas. A instituição recebe pacientes com Microcefalia, Autismo, Síndrome de Down e Paralisia Cerebral. “Temos até terapias para os pais, com psicólogos. Além disso, nossos alunos são atendidos por uma equipe de profissionais. Temos fisioterapeuta, fonoaudiólogo, neuropsicopedagoga, assistente social e uma professora de música. E também oferecemos um curso de espanhol, ministrado por professores da Universidade Estadual de Feira de Santana (Uefs), que contempla, inclusive, algumas crianças carentes do bairro. Nosso propósito é a inclusão. É por isso que lutamos”, afirma o gestor.

O presidente da Cromossomos 21 diz que as famílias precisam entender que pessoas com deficiência têm potencial para se desenvolver. “As terapias ajudam, mas não é o diferencial. O diferencial é a família se envolver e apoiar. Até porque é importante que os exercícios passados sejam realizados em casa”, observa.

Hamilton Teles lamenta o fato de muitas famílias terem preconceito em relação à condição dos próprios filhos. “Que mostrem seus filhos para a sociedade! Que lutem pelos seus direitos! E, principalmente, que participem dos nossos eventos! Isso é fundamental no processo de inclusão plena da pessoa com deficiência na sociedade”, assevera.

Ainda conforme o gestor, o preconceito é a principal barreira imposta aos Portadores de Necessidades Especiais. Ele diz que a discriminação se dá por falta de conhecimento e de convivência. E cita o exemplo do próprio filho, que tem 24 anos e é portador da Síndrome de Down. “Ele quer se firmar na sociedade e exercer o seu papel de cidadão, mas é impedido pelo preconceito. Está na idade de namorar, mas qual menina namoraria um rapaz como ele?”, questiona. 

Hamilton Teles também ressalta que a maior dificuldade da Cromossomos 21 é financeira. “Vivemos em um mundo capitalista, onde se precisa de dinheiro para tudo. Fazer filantropia é muito difícil, porque todos sabem que poucas pessoas se dispõem a estar à frente de uma instituição que não gera ganhos financeiros e ascensão pessoal”, lastima.

Atualmente, a Cromossomos 21 tem um convênio com a Prefeitura Municipal de Feira de Santana. Esse acordo foi firmado após a apresentação de um projeto detalhado, realizado pelo presidente da entidade. “Apenas metade dele foi aprovado, mas esse convênio possibilitou termos condições de formar uma equipe de excelência, composta por multiprofissionais. O problema é que só podemos contratar uma carga horária de 20 horas semanais, sendo que a semana tem 40 horas. Precisamos de dinheiro para pagar os profissionais nas outras 20 horas”, observa.

Para cobrir o déficit financeiro, a entidade tenta angariar fundos realizando festas e buscando parceiros fixos, para ajudar nas despesas. O intuito é alcançar a renda necessária para elevar a carga horária dos profissionais ou contratar novos funcionários, o que, consequentemente, possibilitaria à instituição aumentar o número de vagas.

Hamilton Teles reclama ainda que alguns órgãos públicos tentam burlar as leis que beneficiam as pessoas com deficiência. Ele cita, por exemplo, o caso da Secretaria Municipal de Transportes e Trânsito (SMTT). Segundo o gestor, mesmo com exames que comprovam a condição de deficiente, o órgão obriga o portador de necessidades especiais a passar por perícia com mais de um médico. Na opinião dele, isso acontece apenas para burlar a Lei do Passe Livre. “Mesmo com um exame completo, que constata a condição do indivíduo para o resto da vida, eles exigem que o deficiente passe por dois médicos da Prefeitura Municipal”, critica.

ESTADO E MUNICÍPIO – Alexandre Carvalho Baroni, chefe da Superintendência dos Direitos da Pessoa com Deficiência (Sudef), repartição da Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Desenvolvimento Social (SJDHDS) da Bahia, salienta que a pessoa com deficiência precisa de oportunidades para se desenvolver. “Educação, saúde, trabalho e lazer são as principais”, enumera.

De acordo com o superintendente, muitas são as dificuldades que cerceiam não apenas o direito de ir e vir do portador de deficiência, mas também o exercício pleno de sua cidadania. Alexandre Baroni enfatiza que a limitação se dá tanto no âmbito arquitetônico, com perfis urbanos que não levam em consideração nem respeitam as pessoas com necessidades especiais, quanto na esfera das atitudes, campo onde o preconceito se desenvolve e se impõe. “Precisamos ser vistos como cidadãos de fato”, reivindica.

Criada em maio de 2011, pela Lei Estadual nº 12.212/2011, a Sudef atua no planejamento, coordenação, supervisão, avaliação e fiscalização da execução das políticas públicas estaduais voltadas para a promoção e proteção dos direitos das pessoas com deficiência, que vão desde a acessibilidade até a assistência e inclusão social. O órgão também atua em conjunto com a sociedade civil e suas organizações na elaboração e implantação de projetos. “Temos uma ação específica para o passe livre intermunicipal, a fim de que as pessoas com deficiência e carentes tenham seus direitos de ir e vir garantidos”, complementa Baroni.

No âmbito municipal, o vereador Roberto Tourinho (PV), militante da causa dos portadores de deficiência, destaca que existem inúmeras leis que beneficiam essa parcela da população. “São vários os tipos de deficiência e há leis, em todas as esferas do poder público, criadas para beneficiar pessoas com cada uma delas. Um bom exemplo é a lei que assegura aos paraplégicos e tetraplégicos a aquisição de carros adaptados com a isenção de impostos”, lembra, salientando ainda que, com apoio e suporte adequado, os portadores de necessidades especiais conseguem alcançar grandes patamares.

Sobre as dificuldades enfrentadas cotidianamente pelos deficientes, o vereador também ressalta que, de modo geral, as cidades brasileiras não atendem às necessidades desses cidadãos. “Os deficientes visuais, por exemplo, reclamam da instalação de telefones públicos nas calçadas, sem a colocação de aros na base, o que evitaria colisões. Essa é uma Lei Municipal de minha autoria, que, infelizmente, não é colocada em prática”, lamenta, salientando ainda que a instalação de totens de publicidade e a ausência de pistas táteis nas calçadas são outras das muitas dificuldades enfrentadas pelos deficientes visuais em Feira de Santana.

De acordo com o edil, os cadeirantes também são prejudicados pela falta de estrutura da cidade. A ausência de rampas de acesso nas calçadas é um dos problemas mais graves, segundo Tourinho, que aponta também as dificuldades geradas pelos transportes coletivos inadaptados ou com elevadores quebrados. “Apesar do muito que tem sido feito, há, ainda, uma grande carência, que nos impede de afirmar que Feira de Santana é uma cidade que tem uma política eficaz no atendimento das necessidades da pessoa com deficiência”, observa.

EDUCAÇÃO INCLUSIVA – Rosemeire da Silva Oliveira, chefe da Divisão de Ensino Especial da Secretaria Municipal de Educação, assegura que os alunos com deficiência matriculados nas escolas do Município recebem assistência educacional adequada. “São estudantes como quaisquer outros, mas têm todo um aparato em prol deles. A nossa Divisão tem como obrigação orientar os professores e as famílias sobre a necessidade de um trabalho global e conjunto, que é algo fundamental no processo de crescimento desses alunos”, afirma.

De acordo com o último Censo Escolar, o órgão atende a 3.025 alunos. Rosemeire Oliveira diz que, a cada dia, o número de estudantes especiais matriculados na Rede Municipal de Ensino aumenta. Ela atribui isso à realização de um trabalho feito com dedicação e compromisso. “Fazemos um encontro mensal para discutir o assunto. Conversamos sobre os acontecimentos em sala de aula e buscamos dar aos professores a formação adequada para um bom atendimento das necessidades dos portadores de deficiências. Nosso intuito é sempre buscar melhorias, a fim de que esses alunos especiais, que já são marginalizados e vêm carregados de preconceito, tanto por parte da família quanto da sociedade, não passem mais dificuldades”, completa.

Rosemeire Oliveira enfatiza ainda que conta com a ajuda de instituições parceiras (entidades filantrópicas). Além disso, segundo ela, há também a disponibilidade de salas de recursos multifuncionais, espaços pedagógicos onde os alunos especiais recebem atendimento complementar ou suplementar, no turno oposto ao das aulas regulares. “Nesse ambiente, é realizado o Atendimento Educacional Especializado (AEE), por um professor capacitado, que faz um plano de ação para cada aluno, de acordo com a deficiência apresentada. Ao aluno cego, por exemplo, é ensinado o braile”, informa, ressaltando que esse trabalho é realizado em conjunto com o professor que atua na sala de aula normal.

De acordo com a gestora, as famílias vão à Secretaria de Educação em busca de matrícula para os filhos ou de encaminhamento para instituições voltadas ao cuidado de pessoas com deficiência. “Ligamos para as escolas, então, a fim de saber se há disponibilidade das vagas. Em caso positivo, o aluno é enviado à escola”, esclarece, lembrando ainda algo importante relacionado à aprendizagem de alunos especiais: a necessidade de professores auxiliares. “Isso acontece quando o aluno tem comprometimento motor, da fala ou desestabiliza a sala. Em situações assim, é necessário o suporte pedagógico de outro profissional. Isso é algo que também buscamos contemplar”, explica.

As principais dificuldades das crianças especiais, na opinião de Rosemeire Oliveira, dizem respeito à alfabetização. Segundo a gestora, elas têm defasagem de aprendizado por diversos motivos. Um deles é o comprometimento cognitivo, motivado, quase sempre, pela própria deficiência. “Outra questão é a família, que, muitas vezes, vivencia uma espécie de luto e acaba tardando em colocar as crianças deficientes em uma escola normal. Por medo, muitos pais acabam não dando autonomia aos filhos, superprotegendo-os”, pondera.



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