O poente
amarelado lá fora - mesmo assim, há monumentais nuvens cinza-azuladas a
noroeste do céu feirense - traz a lembrança de que, aos poucos, o verão vai chegando.
Junto com a estação, vem um intenso perÃodo de festas Brasil afora. Além das celebrações
de final de ano, o calendário festivo estende-se por janeiro, culminando com o
Carnaval em meados de fevereiro. O encadeamento dessas lembranças traz Ã
memória a pandemia da Covid-19 e a campanha de vacinação.
Percebo que
muita gente, Brasil afora, está afoita: a vacinação tem que avançar. Só que a
pressa não se deve à necessidade de salvar vidas, nem de normalizar as
atividades escolares, - por exemplo - nem mesmo de consolidar um cenário de
retomada para um paÃs escangalhado. Não, os apressados querem apenas viabilizar
a realização do Carnaval em fevereiro.
Uns,
obviamente, visam ganhar muito dinheiro com a folia; alguns governantes - com
as finanças municipais em petição de miséria - pensam na arrecadação, no
suspiro neste interminável sufoco financeiro; outros - sobretudo a claque foliã
- quer a festa para espantar o mal-estar da pandemia, elevar o astral. Todos,
obviamente, contrariam as prudentes recomendações das autoridades médicas, de
que não é o momento de fazer Carnaval.
O Brasil é,
sem dúvida, o PaÃs do Carnaval. Não é de hoje, a propósito: o escritor baiano Jorge
Amado estreou na literatura há exatos 90 anos com um pequeno romance cujo
tÃtulo era exatamente esse: "O PaÃs do Carnaval". A literatura brasileira, a
propósito, sempre abordou essa disposição festiva do brasileiro. Mesmo com a
pandemia - e o horror dos mais de 600 mil mortos - muitos teimam em festejar,
anseiam por aglomeração.
Acompanho o
noticiário com atenção e noto que, talvez, a insanidade não seja levada
adiante. Aliás, ouço muita gente contra a realização do Carnaval em 2022. Apesar
do declÃnio nos números da pandemia, as monumentais aglomerações carnavalescas
podem impulsionar nova disseminação da doença e - o que é pior - o surgimento
de novas variantes. Quem afirma isso não são filósofos de botequim ou
pensadores de calçada, mas pesquisadores e estudiosos do tema.
A pandemia
trouxe uma lição essencial que os mais sensatos aprenderam: aqui no Brasil a
vida não vale nada. Antes alguns ingênuos imaginavam que era só a vida do preto
pobre favelado que era descartável. Ledo engano: a Covid-19 ajudou a desfazer
essa ilusão. A eleição do arauto da morte em 2018 já sinalizava nessa
direção. Afinal, há apreço pela vida num paÃs que vota num candidato cuja única
proposta é a promoção da morte?
A pressão
pela realização do Carnaval converge bem com essa opção pelo Tanatos...