Um dos nomes mais importantes do cinema brasileiro, o diretor, produtor e escritor Carlos José Fontes Diegues morreu, nesta sexta-feira (14), aos 84 anos. Ele teve complicações decorrentes de uma cirurgia. Não foi informado em que hospital o cineasta estava internado nem a que procedimento havia se submetido.
Cacá Diegues, como ficou conhecido, foi um dos fundadores do Cinema
Novo, ao lado de Glauber Rocha, Leon Hirszman, Paulo Cesar Saraceni, Joaquim
Pedro de Andrade e outros cineastas. O movimento se destacou pela crítica à
desigualdade social que se tornou proeminente, no Brasil, durante os anos de
1960 e 1970.
Imortal pela Academia
Brasileira de Letras (ABL), Diegues nasceu no dia 19 de maio de
1940, em Maceió, Alagoas. Mudou-se, ainda pequeno, com a família, para o Rio de
Janeiro, onde estudou Direito na Pontifícia Universidade Católica (PUC), antes
de se apaixonar e se dedicar integralmente ao cinema.
Ativo integrante do Centro Popular de Cultura (CPC), participou
da única produção cinematográfica realizada pelo órgão, obra intitulada Cinco vezes favela (1961). À frente do
episódio Escola de samba, alegria de
viver, ele dividiu a direção do longa-metragem ao lado de Miguel Borges,
Joaquim Pedro de Andrade, Marcos Farias e Leon Hirszman.
O primeiro filme solo veio dois anos depois, em 1963. Ganga Zumba foi estrelado por Antonio Pitanga
e Léa Garcia. Segundo a Enciclopédia do
Cinema Brasileiro, o longa foi o primeiro nacional protagonizado por atores
negros.
Junto com sua geração de cineastas, Cacá Diegues iniciou sua
trajetória artística com obras políticas e dotadas de preocupação social. Em A grande cidade (1966), voltou sua
atenção à questão do imigrante nas grandes metrópoles.
Durante a ditadura militar de 1964, período de grande
repressão, ele deixou a realidade de lado, investindo na metáfora. Desta época
é o filme Os herdeiros (1969), no qual
o cineasta se volta ao Brasil da revolução de 1930, para contar a história de
um jornalista que entra, através do casamento, para uma família produtora de
café e, aos poucos, vai revelando ambições políticas. O regime militar, contudo,
não aceitou bem a proposta do filme, vindo a censurar a obra.
No mesmo ano, aproveitando um convite para participar do
Festival de Veneza, Cacá Diegues deixou o Brasil, radicando-se em Paris, capital
francesa, com sua então esposa, a cantora Nara Leão.
Ele retornou ao país dois anos depois, em 1971. Nessa
ocasião, fez mais dois filmes, desta vez, aparentemente mais leves e menos
ambiciosos. A conotação política, entretanto, estava presente.
Trata-se se Quando o
carnaval chegar (1972), estrelado por Nara, Chico Buarque, Maria Bethânia,
Hugo Carvana e Antonio Pitanga, e Joanna
Francesa (1973), com Jeanne Moreau.
Diegues alcançou o sucesso comercial nos anos seguintes. Em
1976, lançou uma de suas obras mais renomadas: Xica da Silva. No filme estrelado por Zezé Motta, o cineasta
retomou a questão da escravidão.
Segundo a Agência Nacional do Cinema (Ancine), o longa-metragem
foi visto por 3,2 milhões de espectadores no Brasil.
Depois, veio Chuvas de
verão (1978), com Jofre Soares e Míriam Pires, e Bye Bye Brasil (1980), com José Wilker, Betty Faria e Fábio Júnior.
Com trilha sonora de Chico Buarque, o longa participou da mostra competitiva do
Festival de Cannes.
Com o desmantelo do cinema nacional durante o governo Collor,
Cacá Diegues enfrentou dificuldades para produzir seus filmes. Nesse período, ele
lançou duas obras diretamente na televisão: Dias
melhores virão (1989) e Veja esta
canção (1993), coproduzido por Zelito Viana.
Em 1996, lançou Tieta
do Agreste, filme adaptado a partir do romance de Jorge Amadelenco, Sonia
Braga, Marília Pêra e Chico Anysio. O filme foi visto por 500 mil pessoas, número
considerado expressivo para o período.
Em 1998, dirigiu Orfeu
(1998), com Toni Garrido e Patrícia França. A obra é uma adaptação da peça
teatral Orfeu da Conceição, escrita
por Vinícius de Moraes.
Deus é brasileiro, uma das obras de maior sucesso
comercial de Cacá Diegues, foi lançada em 2003 e tinha Antônio Fagundes e
Wagner Moura encenando os papeis principais. O longa vendeu 1,6 milhão de
ingressos. Vinte anos depois, o cineasta filma a continuação Deus ainda é brasileiro. A obra segue
inédita.
O último filme de Diegues lançado comercialmente foi O grande circo místico (2018). O
espetáculo é inspirado no poema de Jorge de Lima e tem trilha sonora
de Chico Buarque e Edu Lobo. Estrelado por Jesuíta Barbosa, Juliano
Cazarré e Bruna Linzmeyer, o longa foi exibido no Festival de Cannes.
DIVERSIDADE E INCLUSÃO – O tom político nunca foi abandonado
pelo cineasta, que também tratou da inclusão e da diversidade, em suas obras.
Nos anos 1990, idealizou o Núcleo de Cinema do Nós do Morro. E, em 2010, produziu
5 X Favela, agora por nós mesmos, o
primeiro longa brasileiro totalmente concebido, escrito e realizado por jovens
cineastas moradores de favelas do Rio de Janeiro.
Cacá Diegues deixou, do casamento com Nara Leão, da qual se
separou em 1977, os filhos Isabel e Francisco Diegues. Do casamento com Renata
Almeida Magalhães (1981), produtora com quem realizou boa parte de seus filmes,
nasceu Flora Diegues, falecida aos 34 anos, em 2019, vítima de um câncer.
Cacá Diegues foi eleito para a ABL em 2018, em sucessão ao
amigo e colega Nelson Pereira dos Santos, que ocupava a cadeira de número 7.
Na posse, em abril de 2019, ele declarou: “não preciso
explicar o que significa, para mim, ocupar a cadeira que foi de Nelson Pereira
dos Santos, nessa Academia. Às vezes, penso até que pode ter sido uma ousadia
desavergonhada de minha parte, ter-me candidatado a ela. E peço licença para
acrescentar que, mexe também com meu coração e minha excitação, pensar que era
esse mesmo número 7 o que víamos às costas de um dos maiores gênios barrocos de
nossa história, o incomensurável Garrincha”.
Cacá Diegues foi homenageado no Grande Prêmio de Cinema
Brasileiro, em 2012, no Theatro Municipal do Rio de Janeiro.
*Com informações do jornal O Globo e portal G1.