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César Oliveira - Crônicas

Calabresa ou Margherita

César Oliveira - 30 de Abril de 2019 | 20h 55
Calabresa ou Margherita
Tem coisas que duram uma vida inteira para aprender: criar um filho, fazer chiclete de bola, lidar com a saudade. E, antes que acabe o dia- é seu aniversário- quero te dizer que estou aqui, pois, aos filhos, é o que basta de um pai: a certeza que ele está ali. Sei disso, pois, quando pequeno você dizia ”pai ô pai”, vinte e cinco vezes por minuto. Eu sei. Eu contei. Você não dizia nada depois, não havia pedidos. Talvez, fosse só para ter a certeza que estava realmente ali; talvez, apenas, para fazer o pastoreio do amor paterno. Filho, o primeiro. Filho homem.
 
Não sei se você é destes filhos que envelhecem rápido ou dos que levam reencarnações inteiras para isto, mas sei que é destes que botam o pé no mundo. Agora, mesmo, você está aí em algum lugar do outro lado dele, aprendendo francês – o primeiro em que não estamos juntos, nem com sua avó, que por arte do acaso nasceu no mesmo dia, ligando meu antes e depois-, e já não sou o governante de seu destino. Aliás, nunca sabemos se somos, se nos adotam ou rejeitam; se imitam, ou fazem o avesso; se nos admiram ou culpam. Talvez, mais provável, tudo isto.
 
Você mandou uma filmagem do Cavern Club, onde os Beatles começaram. Você sabe que eu queria ir. Agradeço ter lembrado. Deve ter sido das poucas coisas que ensinei: música boa, mas sem esnobismo. Gostamos de bossa nova; sim, Reginaldo Rossi, e disco de vinil. Certo que você retribuiu me revelando que aqueles pintores que eu admirava eram só tartarugas ninjas- Leonardo, Donatello, Michelangelo e Raphael-, me fazendo ver a verdade. Nunca mais consegui vê-los do mesmo jeito.
 
Sei que vivemos a velha e boa infância, os verões, lemos Harry Potter, e todas aquelas coisas de pais e filhos e suas jangadinhas e viajamos com a família. Ou nós dois. Deve ser isso a saudade de hoje. Não sei lidar com ela, mas toco em frente. Maduro, sou eu. Te ensinei a dirigir e repartirmos nossa incompreensão sobre as mulheres. Gostamos de ironia, humor fino, e vinho de sobremesa. Fui paraninfo de sua turma de formatura. Devo-te esta.
 
Você é inteligente, perspicaz, decidido, correto, familiar e leal. Fiquei amigo de sua turma de jovens e você, foi adotado, “mi hijo”, pela minha. Acho isso legal. Talvez, por isso, a saudade. Não sei lidar bem com ela. Maduro, não sou eu.
 
Um conselho:tenha paciência. Esteja preparado, seja justo e a vida se dobrará aos pés, ainda que se dê aos solavancos. Às vezes ela é como aquelas nossas idas a pizzaria, aos domingos, quando ficamos na dúvida: calabresa ou margherita? Viver demora uma vida inteira. Às vezes, mais. E, se precisar, filho ô filho, estou aqui.
 
Te amo, feliz aniversário.


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